A fome é a expressão biológica dos males sociais .

José Álvaro de Lima Cardoso*. 

 

 

A depressão econômica que o Brasil enfrenta, somada ao conjunto de maldades colocado em marcha pelos golpistas, está empurrando o País de volta ao mapa mundial da fome, da ONU. Em setembro de 2014, relatório apresentado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês), organização que trata do estado da insegurança alimentar no mundo, oficializava a saída do Brasil, do referido mapa. Na ocasião o Brasil tinha reduzido em 75% a pobreza extrema, definida como o número de pessoas com renda inferior a US$ 1 ao dia, entre 2001 e 2012. Desde 1990, o percentual dos brasileiros que passavam fome havia reduzido de 14,8% para 1,7% da população, equivalente a nada menos que 3,4 milhões de pessoas, uma população do Uruguai inteira. Para os critérios utilizados pela FAO, um percentual abaixo dos 5% indica que o país não tem mais fome estrutural, mas somente bolsões isolados de famintos. 

 

 


O sucesso do Brasil no combate à fome, operação bastante complexa, foi fruto de um conjunto de políticas e ações integradas:
● Expansão da oferta de alimentos; 
● Forte ampliação do crédito;
● Aumento da renda dos mais pobres com o crescimento real significativo do salário mínimo e a geração de 21 milhões de empregos no período apontado;
● Programa Bolsa Família, que atende hoje 53 milhões de compatriotas;
● Garantia da merenda escolar, programa que, em 2015, servia 43 milhões de refeições todo santo dia. 

 

 


A elevação da segurança alimentar da população foi o resultado, portanto, da combinação de políticas macroeconômicas, sociais e agrícolas, empreendidas e lideradas, necessariamente, pelo Estado. Combinou-se políticas de geração de empregos, aumentos reais do salário mínimo e políticas de expansão do crédito. Entre as que mais contribuíram para os resultados está o fortalecimento da alimentação escolar e programas que beneficiam os agricultores familiares (responsáveis por cerca de 70% do consumo de alimentos no país), um dos setores sempre mais atingidos pela falta de garantia de renda, em função das suas características sociais e produtivas. 

 

 


Foram fundamentais também no processo os programas de erradicação da extrema pobreza, e o desenvolvimento das redes de proteção social como medidas de inclusão social. A preocupação com a povo mais pobre, e a elevação das políticas de combate à fome à condição de políticas de Estado, foram fundamentais para o sucesso do Brasil no combate à fome. Foram ações complexas, integradas e viabilizadas pelo fato de que estruturas estatais foram colocadas à serviços do objetivo de diminuir a fome no Brasil. Políticas como essa não podem ser fortuitas, ou depender da benevolência das classes abastadas. A fome aparece diariamente, e mais de uma vez por dia. Portanto as políticas que a combatem têm que ser sistemáticas, perseverantes e regulares. 

 

 


No conjunto de ações encaminhadas, o Programa Bolsa Família é uma das mais importantes, pois retira 53 milhões de brasileiros da fome, com 0,5% do PIB. O gasto com o Programa, R$ 28 bilhões em 2017, é ínfimo, considerando o orçamento federal. Para termos ideia de quão modesto é esse custo no contexto dos gastos públicos, o governo federal desembolsa em média por ano, com os juros da dívida pública, mais de R$ 500 bilhões, para o enriquecimento ainda maior de cerca de 10.000 famílias. 

 

 


Que o governo golpista iria encurralar os programas de erradicação da fome estava escrito nas estrelas. Em 2016, logo após o golpe, o governo fez um "pente-fino" no cadastro do Bolsa Família, alegando que o programa estava lotado de beneficiários que fraldavam os dados para receber o recurso sem necessidade. No entanto, a operação foi inútil, pois apenas confirmou que a pobreza está aumentando, portanto, aumenta a necessidade de ampliar o número de beneficiários. Ademais, o esperado reajuste no benefício, que seria de 4,6%, foi suspenso no fim de junho, com a alegação de falta de recursos. 

 

 


Isso ao mesmo tempo que, em abril último, o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) decidia que o banco Itaú não precisará pagar impostos relativos à fusão Itaú/Unibanco realizada em 2008. O valor do benefício concedido ao banco, no meio de uma crise fiscal dramática, é de R$ 25 bilhões, o processo de maior valor que tramitava no Carf. A doação ao gigante do setor financeiro foi encaminhada pelo governo Temer. O detalhe é que o presidente do Banco Central, Illan Goldfjn, é sócio do Itaú. A doação é feita ao mesmo tempo em que, usando como pretextos a crise e a falta de dinheiro, o governo empreende o maior ataque aos direitos sociais e trabalhistas registrados na história do Brasil. Os recursos doados pelo Carf ao banco, que irão beneficiar meia dúzia de milionários, equivalem praticamente ao orçamento do Bolsa Família para este ano. O detalhe adicional é que Itaú Unibanco obteve lucro líquido de R$ 22,2 bilhões em 2016, o maior entre os bancos brasileiros, como já vem ocorrendo há alguns anos. 

 

 


Por detrás das escolhas das políticas macroeconômicas deste governo, estão interesses econômicos extremamente poderosos, capitaneados pelo imperialismo norte-americano, principal força do golpe. A interrupção de um processo no qual o povo pobre estava tendo maior acesso à uma alimentação adequada, saudável e regular, e a doação ilegal e descarada de dinheiro púbico a bancos, são duas faces da mesma moeda. Nessa altura não podemos ter ilusões. Este governo é o mais antinacional, entreguista e antipopular da história. Para quem já fez o que já fizeram nos campos da destruição de direitos e da entrega da soberania, aumentar o número de famintos no Brasil é tarefa fácil, que estão tirando de letra. 

                                                                                               

      *Economista.